SARTRE ET MOI



Mas, pergunto o Que é a literatura? Com metafóricas comparações-referenciadas, Sartre me contesta e explicita a relação do homem com o mundo do século XX. Com a finalidade de refletir sobre a correspondência entre o poeta e seu meio. Ou melhor, a incorrespondência, já que de acordo com ele, o poeta se ausenta, “está fora da linguagem, vê as palavras do avesso”. A ambiguidade do meio, no entanto, vai além da licença poética. Meio-lugar e meio-palavra. O primeiro traduz a tendência do produtor literário dos anos 1950. Com ênfase no gênero masculino e no existencialismo. No Brasil, o atraso culminou em experimentações artísticas na década de 1960, influenciadas pela contracultura. O pós-modernismo, no Brasil, leva aos bares e às livrarias, discussões que evidenciam a necessidade de transgressão do movimento, o fundaram, portanto, à margem.
Já no que diz respeito ao meio-palavra, Sartre confessa que o poeta estabelece com a palavra um vínculo ímpar, pois ele “a manipula a partir de dentro, sente-a como sente seu corpo”. Logo, o peito-texto do poeta abandona a sua raiz-instrumento e passa a ser a realização de sua atitude poética. Isto é, ele faz da palavra uma armadilha de captura, de uma realidade fugaz, que penetra, antes e silenciosamente, dentro do poeta. O espelho está para os olhos do poeta, assim como a linguagem está para o reflexo deste espelho. Regra de três: poeta, poeta-personagem e leitor! Exclamei.
Não culpem Sartre pela lógica, a culpa é minha. Quando soube que falaríamos sobre espelhos, logo recorri à física, que fiasco! As teorias que envolvem este meta-espelho são, mais facilmente, encontradas em livros de prosa. Em que há, como na poesia, um déficit de mundo real. Ele deu de ombros sobre a minha digressão. Prosseguiu, agora comparando o prosador com o poeta. Enquanto o primeiro “expõe seu sentimento, esclarece”, no verso, o poeta o esconde, “deixa de reconhecê-lo”. Como se as palavras do poeta se apoderassem de suas emoções e paixões. Este processo metamórfico, explica ele, transforma a palavra em substância.
A complexidade da comparação feita por Sartre me intriga. Pra completar, ele defende que a poesia cria o mito do homem e a prosa seu retrato. Poesia. Mito. Prosa. Retrato. Já exausta da matemática, intuo sobre o paradeiro do plano real, o mundo real, ele entra onde? Sartre é metafórico até mesmo rindo, mas eu escuto a frouxidão alta de sua gargalhada, que confirma a irrelevância em acessar o mundo real do poeta. Disse ele “o insidioso esforço da biografia” e encerrou nosso encontro citando Hegel: “o nome se revela inessencial diante da coisa – esta, sim, essencial”.

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