Factory Girl


Um dia estávamos almoçando, eu e minha amiga Ceci, e ela me indicou de cara o Factory Girl (Garota Irresistível no Brasil). Quando ela falou que contava a história de uma ‘it’ girl que atuava em filmes experimentais do Andy Wahrol, eu TIVE que assistir. No começo achei que ele não teria espaço aqui, porque pensei ser daqueles filmes pesados, sabe? Que a gente tem agonia e passa três dias de cama depois de ver, ( “A concepção” é esse tipo de filme, que joga bosta na nossa cara). Mas não, não é o caso desse filme. Factory Girl tem uma proposta bem intrigante. Como o contexto retrata o universo da representação, o mundo da arte, além das pinturas do Wahrol que dão plasticidade às imagens-movimento, o misto de gravações em preto, branco, colorido faz a gente confundir entre os fatos e as ficções.
Baseado em uma história real, Factory Girl celebra  o mundo glamouroso da arte, mas de uma maneira menos atrativa que o normal. O enredo gira em torno da trajetória da atriz/modelo/produtora/socialite amaricana, Eddie Sedgwick, ‘lançada’ por Warhol em suas produções experimentais. Digo que não é tão atrativo esse mundo da arte que o filme propõe não apenas pelas drogas que – já levou muito artista irado, mas porque é meio grotesco e seco, essa coisa do conceitual que se sobrepõe à vida real no mundo da arte. Como se o efeito da reprodutibilidade técnica da arte de Warhol fosse além dos tons fortes e das gravuras montadas, entendem? Ele levava esse conceito pra vida. Numa onda de encantamento com Eddie, ele a chama para protagonizar um filme, ela leva esse convite de maneira intensa e entra na personagem. Detalhe: o telespectador descobre a ‘autonomia’ de Eddie como personagem, na produção independente de Wahrol, quando nota que o filme gira em torno de um perguntas-respostas-e-confissões da atriz em frente a câmera. A coisa é tão estranha que não há um roteiro, é quase um método do improviso, mas sem tanto conceito por trás. Na verdade, Eddie dá uma pirada  e não discerne muito entre o que é real e o que é ficção e a sensação que temos é que Warhol alimenta essa confusão, não apenas com drogas e bebidas, mas com a promessa do sucesso.
Vale lembrar que o filme que foi lançado em 2006, se passa nos anos 1960 e conta os bastidores da produção experimental ‘Poor Litle Rich Girl’, do Wahrol, que foi lançado em 1965. O requintado meio artístico americano se mostra uma armadilha movediça para Eddie, interpretada por Sienna Miller.  A fama, o vislumbre, foram sentimentos vividos por ela. A parte ruim disso, o passageiro do sucesso, os 15 minutos de fama, era algo que Wahrol temia e conhecia, mas Eddie descobriu isso da pior maneira.
Antes de decair, ela era a preferida do artista, interpretado por Guy Pearce, andava com ele por todos os lados. A afeição de Wahrol pela moça ultrapassa o encantamento e admiração, mas tudo cai por terra quando ela começa a se envolver com o Bob Dylan. O precursor da Pop-Art se sente traído, de acordo com o filme, e depois de um embaraçoso encontro com o cantor/compositor – que é puro charme, pelamordedeus - Wahrol fecha as portas para Eddie.
É provável que a sequência dos fatos na realidade não seja essa, mas no filme, Dylan se incomoda muitíssimo com a relação descartável entre Wahrol e Eddie, fazendo-a perceber que talvez haja certa manipulação por parte do artista plástico. Com uma formação familiar desorientada, um pai abusivo e a mãe passiva, Eddie sempre teve o que quis, mas ao decidir levar uma vida de Star, o pai nega ajudá-la.
O filme conta a parte da vida de Wahrol, quando ele conhece Eddie, ou seja, é um recorte do que rola no inicio de sua carreira. A elegância, o ar blasé e a liberdade são algo que dinheiro e fama conseguem manter. Eddie em seu ápice andava luxuosa, carregada de brincões – baphônicos, inclusive – cortou o cabelo, descoloriu e fez a vibe Twiggy misturada com Marilyn Monroe. Tentei materializar um pouco a personagem com essas referências, mas preciso assistir mais vezes a esse filme e tirar novas observações e analogias.
O que me motivou na escolha desse como o 5º filme para se assistir repetidas vezes foi essa viagem ao mundo da arte nova iorquino dos anos 1960,  a possibilidade de entrar nos bastidores de um dos universos mais requintados e essa coisa do machismo que, lógico, rolava na época com todo o vapor. Não entrei nesse ponto anteriormente, pois não é algo que o filme questione ou evidencie de maneira direta. Mas é importante perceber como Warhol usou a ‘fragilidade’ de pobre menina rica de Eddie, criando um filme que tinha como intuito expor a vida luxuosa da modelo, de forma fria e abusiva.
Dentre os meios hierárquicos e masculinizados está a classe artística, em que Eddie consegue penetrar devido aos filmes Warhol. A sensação que temos é que ela não consegue se distanciar do que lhe foi proposto na representação, como se ela estivesse presa e destinada a ser sempre a Poor Litler Rich Girl e quando ela para de ser Rich, ela se perde. Andy Warhol manipula um pouco a situação e ele, como mentor, a iludiu mais do que a produziu. Parece que toda a resignação de Eddie à Warhol culmina na ideia do mito, como a Marilyn, de morrer para viver na eternidade.
A Factory foi o cenário de várias experimentações do artista, que além do cinema também se aventurou na música. Após cortar os laços com Eddie, Warhol lança outra ‘it’ girl, a Nico, vocalista do The Valvet Underground. Tem até a capa do disco The Valvet Underground and Nico produzida por Andy Warhol. Ao que parece o pseudônimo da nova ‘it’ girl, é um anagrama de ICON (ícone), proposto pelo artista plástico.
Confesso que admiro pra caramba as obras de Warhol, mas esse filme faz com que vejamos suas obras com outro olhar e com uma crítica à reprodução técnica e à massificação traiçoeira do mundo da arte. Espero que vocês curtam a dica e compartilhem novas viagens sobre o filme! P.s.: O Factory Girl tem no Youtube, assim como o Poor Litle Rich Girl, que tá disponível em fragmentos, lá também tem uns docs sobre o Andy Warhol bem bacanas, fica a dica!

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